contos, pseudojornalismo

Eternos Fins de Semana na Cidade do Outono Cinza

pace_murosilusoriosFalsas notícias no feice das aparências, o medo da foice e a perplexidade estampada na face. Nos sonhos sinto cheiro de esperança e sou o tagarela do passado, no presente me emudeço com tanta ladainha e essa ausência de perspectiva no país dos maldosos pais. Pais que mentem, extorquem, desviam e ainda vendem o país para o estrangeiro. Temerosos pais, pais que batem em professores e ainda anseiam por cargos mais altos no congresso disputado por cobras e ratos engravatados. Na cidade do outono ensolarado e ao mesmo tempo mais cinza da história, um vizinho dispara quatro tiros e mata um baixista simplesmente por estar incomodado com o barulho alheio. No espelho preto nas mãos cada vez mais vazias, mensagens apocalípticas se proliferam em grupos familiares, grupos de amigos antigos, grupos de gente que prefere ficar em casa escrevendo ou compartilhando essas mensagens, ao invés de sentar no bar e rir, ou talvez chorar coletivamente, em sinal de empatia. Se for pra ficar em casa, prefiro o caos das rádios alternativas, os poemas em reverb, os verdadeiros e sorrateiros programas da madrugada. E assim, o vinho nacional de 12,90 começa a fazer sentido.

Os anjos da morte dos castelos de Jennifer me acompanham pela pacata caminhada rumo as máquinas do dinheiro. Agradeço pela companhia, afinal, hoje é o dia deles e também o dia de lembrarmos que o latim continua sendo um idioma vivo. Engraçado pensar que a morte faz esse idioma se tornar vivo. A morte não precisa ser necessariamente física. Morremos todos os dias, morremos de amor e morremos de ódio também. Esse mesmo ódio perpetuado por gente com mania de escolher lado: seja no futebol, na igreja ou na política. E aqueles que como eu, preferem o muro, são julgados por ambos os lados. Prefiro acreditar que esse muro é ilusório e está sempre atrelado às infinitas condições, que costumam variar de acordo com a época ou pior, de acordo com as vantagens pessoais vislumbradas por ideologias de araque, compradas no boteco da esquina, cada dia mais obscura.   

É na madrugada que tudo começa a fazer algum sentido. É no silêncio dessa escassez de estímulos e interrupções que as peças parecem se encaixar. Viagens atemporais dão vazão aos verdadeiros temporais mentais, pensamentos desconexos tão rápidos e efêmeros como as piscadas em frente a tela branca formada por milhões de números binários. Os números binários podem ser irrelevantes, mas vivemos em um tempo onde números são tão importantes quanto os próprios seres vivos. Uma ida ao posto ou ao mercado após a greve dos caminhoneiros comprovará essa teoria facilmente. E se as estatísticas são manipuláveis, os orçamentos estão longe de ser. É preciso uma boa dose de otimismo para enxergarmos essa luz no fim do túnel. Nessas horas, a criatividade aponta os caminhos possíveis. O grande problema talvez seja perceber que não estamos sozinhos nesse trem verde e amarelo. Dependemos de decisões coletivas e talvez em algum âmbito mais microscópico, decisões individuais tomadas nas tais urnas anônimas, caso elas de fato ainda possam existir. Só posso esperar que ao menos esse direito, eles não tirem da gente.

E que venham as intervenções, literárias ou alienígenas, obviamente.

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